O turismo brasileiro, em grande parte, foi estruturado sob uma perspectiva eurocêntrica. É comum destacar fortemente a herança colonial portuguesa e a influência de imigrantes europeus, enquanto a presença e a contribuição da população negra permanecem pouco exploradas como atrativo turístico. Quando destacadas, quase nunca é sob a perspectiva negra, mas sim sob a narrativa de quem está contando a história, ou seja, os mesmos que escreveram os livros que, por anos, seguem sendo lecionados nas escolas brasileiras. Esse apagamento histórico contrasta com o fato de o Brasil abrigar a maior população negra fora da África.
Mas afinal, o que é Afroturismo?

Longe de ser apenas uma categoria de viagem, o Afroturismo surge como uma proposta de restabelecer essa memória. Ele vai além da narrativa da escravidão e coloca em evidência aspectos de resistência, inovação e legado cultural. Quilombos, manifestações artísticas como samba e capoeira, religiões de matriz africana, gastronomia afro-brasileira e patrimônios reconhecidos pela UNESCO, como o Centro Histórico de Salvador, são exemplos de experiências com alto potencial de atração.
O turismo tem uma característica única: a capacidade de gerar empatia. Ao viajar, o visitante é colocado em contato com diferentes realidades, culturas e modos de vida, o que amplia sua percepção de mundo. Essa “mágica” de ver pela perspectiva do outro não apenas enriquece a experiência individual, mas também contribui para sociedades mais conectadas e conscientes.
Nesse contexto, mais do que visitar locais, trata-se de vivenciar histórias contadas a partir de novas perspectivas (visão afrocentrada). Muitas vezes, os roteiros turísticos são narrados sob a ótica de quem detinha o poder histórico, o que resulta em visões parciais e, em alguns casos, distantes da realidade de quem viveu a experiência da opressão. A preparação de guias e profissionais do setor para narrar a perspectiva negra é, portanto, crucial.
Levando em consideração também o aspecto econômico, esse setor é uma grande oportunidade. A estruturação de roteiros em comunidades quilombolas e a promoção de produtos e serviços ligados à cultura afro-brasileira contribuem para a geração de renda local e ampliam a diversidade da oferta turística nacional. Outro ponto relevante é a inclusão do turista negro como protagonista, tanto como consumidor, quanto como anfitrião, pois é um movimento que reforça pertencimento e amplia o público do setor.
Existem diversos programas e agências que são especializadas em passeios e excursões voltadas ao afroturismo. Em São Paulo, por exemplo, há o Sampa Negra, que se dedica em tours guiados que desvela memórias subterrâneas, valoriza a ancestralidade africana e conecta pessoas às histórias de resistência que moldaram a identidade da cidade de São Paulo, como por exemplo passeios guiados pelos bairros da Bixiga e Liberdade (clique aqui para mais informações). Já no Rio de Janeiro, há passeios onde o afroturismo foca na “Pequena África”, na zona portuária, que abriga o Cais do Valongo (Patrimônio Mundial da UNESCO) e locais como a Pedra do Sal e o MUHCAB, que é realizado pela Diáspora Black (clique aqui para mais informações).

Brasil reconectado: memória restabelecida
Nos últimos anos, iniciativas como o programa Rotas Negras (clique aqui para saber mais), do Ministério do Turismo, começaram a dar visibilidade ao tema. Mas ainda há um caminho importante a percorrer para que o Afroturismo deixe de ser visto como complemento e se torne parte estratégica da oferta turística nacional. Consolidar essa agenda significa não apenas fomentar um setor promissor, mas também reconhecer, valorizar e projetar para o futuro a presença negra que molda a identidade do Brasil. O Afroturismo, quando levado a sério, não é só uma oportunidade de mercado: é uma forma de contar a história completa do país e transformar a experiência de quem o visita.
Escrito por Rodrigo Ribeiro, Marketing na SMI.