Estamos cada vez mais viciados em conteúdos online rápidos e acelerados. Tudo é curto, cheio de estímulos — sons, cores, textos — e nosso cérebro recebe tantas informações ao mesmo tempo que fica difícil saber o que realmente será absorvido.
Enquanto você avança os stories no Instagram, chega a notificação do TikTok avisando que a influenciadora postou um novo vídeo. Ao mesmo tempo, o grupo do WhatsApp não para de falar e o X envia recomendações de posts com base no seu perfil. Já reparou como é possível passar horas rolando o feed sem nem perceber o tempo passar? Uma notificação aqui, um vídeo rápido ali e, quando se dá conta, já é madrugada. Isso é o que muitos especialistas chamam de Era da Dopamina.
A dopamina é um neurotransmissor conhecido como o “mensageiro do prazer”. É ela que nos proporciona aquela sensação boa depois de comer algo delicioso, concluir uma tarefa ou receber um elogio. Um cérebro acostumado a doses constantes de dopamina passa a buscar prazer o tempo todo, de maneira rápida e imediata. Quanto mais consumimos conteúdos curtos e ágeis, mais difícil se torna ter paciência para conteúdos longos e profundos, que começam a parecer entediantes.
A psiquiatra Anna Lembke, autora do livro Nação Dopamina, compara a internet e as redes sociais a uma verdadeira droga. Segundo ela, cada curtida e cada notificação funciona como um pequeno pico que faz nosso cérebro desejar mais. Em alguns casos, essa dependência pode ser tão séria quanto o vício em álcool ou até mesmo em outras drogas.
De acordo com a The Honest Broker, o setor que mais cresce na economia cultural é o da distração, e vale lembrar que entretenimento e distração não são a mesma coisa. Consumimos tantas coisas ao mesmo tempo que, no fim, não conseguimos nomear nada do que vimos. Tudo soa como tempo perdido.
Em vez de filmes, os usuários recebem uma sequência infinita de vídeos de 15 segundos. Em vez de músicas inteiras, ouvem apenas trechos curtos, muitas vezes acompanhados por esses vídeos rápidos. Não à toa, já existem diversas músicas lançadas diretamente para o TikTok, com duração de apenas um minuto ou um minuto e meio, feitas para gravar, viralizar e logo serem substituídas pela próxima tendência.

Quando estamos viciados em dopamina, a busca por prazer rápido acaba diminuindo o prazer em outras experiências. Tudo o que não é acelerado ou altamente estimulado perde a graça, e acabamos ficando mais entediados, distraídos e menos criativos. O Relatório Mundial da Felicidade entrevistou 150 mil pessoas em 26 países e descobriu que os Estados Unidos e outros países tecnologicamente avançados estão sofrendo um declínio significativo na felicidade.
Anna Lembke recomenda até um jejum de dopamina, ou seja, ficar algumas semanas longe das redes sociais para que o cérebro retome seu equilíbrio natural. Não se trata de cortar completamente o uso das telas, mas de aprender a equilibrar seu consumo no dia a dia.
As reflexões sobre vício e distração já impactam negativamente o mercado de entretenimento, como no cinema e na televisão. Até a Disney, uma das maiores referências mundiais do setor, enfrenta crises. Na música, alguns artistas chegam a se tornar mais valorizados depois de mortos do que quando vivos, justamente por conta da viralização.

O que acontece quando damos um tempo das redes
A National Geographic Brasil trouxe estudos que mostram o efeito imediato de uma pausa. Em um deles, adolescentes que ficaram apenas três dias sem redes sociais relataram melhora na autoestima e menos preocupação com a aparência. Outro estudo revelou que limitar o uso a 30 minutos por dia já foi suficiente para melhorar o sono e reduzir o estresse.
O caminho para a felicidade autêntica não está em abolir a dopamina, mas em equilibrá-la de forma consciente.
Os impactos na infância
Como já mencionamos, o vício em redes sociais pode ser comparado ao vício em álcool e drogas. De acordo com uma pesquisa realizada por Júlia Khoury, da UFMG, crianças e adolescentes muito expostos às telas podem desenvolver nomofobia, uma condição que causa medo irracional de ficar sem o celular ou tablet.
“A gente percebe uma alteração no comportamento da criança. Ela se torna mais irritadiça, agressiva, e apresenta problemas de concentração e aprendizado. Os pais devem ficar atentos a esses sinais e limitar o uso”, disse Júlia em um podcast para o g1.
Pesquisas indicam que a infância está se transformando. Antes marcada por brincadeiras, hoje ela é dominada por telas. O psicólogo Jonathan Haidt chama esse fenômeno de “grande reconfiguração da infância”. Dados da UFSC mostram que crianças expostas às telas durante a noite consomem menos alimentos saudáveis e ingerem mais ultraprocessados, o que favorece a obesidade.
A exposição excessiva também reduz as conversas com os pais e está associada a sono ruim, miopia, nomofobia e à síndrome do toque fantasma, condição psicológica em que a pessoa sente, por engano, que o celular está vibrando ou recebendo uma notificação.

Vivemos em uma era em que nossa atenção é um dos bens mais valiosos. As redes sociais sabem disso e fazem de tudo para nos manter conectados. Mas a escolha final ainda é nossa. Com limites digitais, pausas estratégicas e o resgate de conexões reais, podemos reativar o poder da nossa atenção e retomar o controle das doses de dopamina.
Por Verônica Lira – Marketing Analyst na SMI.