Precisamos estar conscientes sobre o impacto da artificialização da beleza
Esse espaço aqui é para batermos um papo com você não apenas sobre turismo e assuntos totalmente relacionados à indústria, mas principalmente sobre assuntos que nos inspira. E esse vídeo clipe da cantora Christina Aguilera é muito inspirador ao mesmo tempo que é bem provocativo.
A música “Beautiful”, uma das mais icônicas da cantora, completa 20 anos de lançamento esse ano, e essa música nunca foi tão atual, por isso ganhou um novo clipe. Com uma letra que busca por empoderamento para aceitar e valorizar as belezas individuais e não se deixar ser consumido pelos padrões estéticos da sociedade, ganha um novo vídeo clipe com crianças como grandes vítimas das redes sociais.
A artificialidade das redes sociais como Instagram e TikTok provoca danos na saúde mental dos usuários, e com crianças é ainda pior pois estão em formação como indivíduos e lhes falta maturidade para discernir do real para o artificial.
A oferta e o uso de filtros que nos deixam mais sarados, bronzeados, com olhos mais claros e pele tão lisa quanto a da Barbie (aquela de plástico mesmo) é enorme e muito comum nessas redes. Me arrisco a dizer que chegamos em um momento em que o estranho se tornou ver imagens sem filtro ou tratamento, afinal com tanta tecnologia disponível, como que podemos sair com a mesma cara que nos vemos no espelho ao acordar?!
O ‘Eldorado’ do sistema econômico
Em 2020 eu apresentei uma dissertação na ECA-USP sobre a “estetização de si” e uma análise nos perfis em aplicativos de relacionamento, o que podemos muito bem estender aos perfis de redes sociais, principalmente Instagram e TikTok. Minha pesquisa foi muito baseada no livro “A Estetização do Mundo — Viver na Era do Capitalismo Artista” dos autores Gilles Lipovetsky e Jean Serroy.
Os autores mencionam que a beleza se tornou o “Eldorado” do atual sistema econômico, vivemos um superconsumo estético para realçar a beleza dos corpos e dos rostos. Associando isso com o conceito de “capital social” do Pierre Bourdieu, o qual se trata do valor relacionado às conexões sociais, ou seja, representa o recurso que é facilitado dependendo de quem se conhece, o número de relações sociais e posição de dominação que se ocupa.
Estar entre os mais bonitos e ser aceito (e valorizado) em um grupo não vem de hoje, aliás a valorização estética e a relação com o social é uma característica humana e acompanha a história da sociedade desde os tempos primitivos. Tenho certeza que qualquer um que estiver lendo esse texto e que foi criança ou adolescente antes do Orkut já sentia essa pressão por estar dentro de um padrão estético na escola, muitos sofreram com aparelho nos dentes, espinhas, muito alto ou muito baixo, vários modos de bullying antes de se chamar bullying. Já era muito triste voltar para casa se sentindo feio na escola, mas em casa você tinha outras distrações e grande parte das vezes aquele fato ficava na escola, não chegava na sua turma de inglês, nos amigos da natação ou com os vizinhos do prédio.
Acontece que ser criança e adolescente no mundo hiper conectado, quando você sai da escola e chega em casa e os seus desafios de pertencer ao grupos se estendem ao online, é como se isso estivesse sendo reproduzido por toda parte. E o valor que a sociedade contemporânea se da ao número de likes e seguidores pode refletir na construção do seu capital social, ou seja, de quem você é nessa sociedade.
A relação das crianças

É muito delicado discutir sobre a relação de crianças e redes sociais, nem me atrevo a isso nesse texto, mas quero deixar a reflexão do impacto causado. Se esse impacto dos filtros e de um padrão estético digitalmente artificial e inalcançável fora das telas afeta adultos que estão buscando cada vez mais por cirurgias plásticas e harmonização facial, imagina em um jovem indivíduo que está em formação.
O novo clipe da Christina Aguilera termina com o texto:
“Nos últimos 20 anos, desde que Stripped (o álbum que contém essa música) foi lançado, as redes sociais transformaram nossa relação com nossos corpos, e em contrapartida, com nossa saúde mental. Pesquisas apontam que o tempo gasto nas redes sociais é associado a distorções de imagem corporal, automutilação e distúrbios alimentares em crianças e adolescentes. Isso precisa mudar.”
Tem muita gente prestando atenção para os impactos dos filtros das redes sociais, tanto que o BeReal (uma rede social onde você posta suas fotos sem filtro e sem edição na hora que recebe um aviso) não para de crescer.
Adoro o Instagram e o TikTok, a proposta aqui não é demonizar essas plataformas, mas sim lhe convidar a fazer parte da mudança. Deixar o ambiente digital mais saudável, mais realista e com menos horas consumida. Vamos viajar sem postar o tempo todo em tempo real. Vamos tirar fotos sorrindo em uma boa luz sem filtros. Vamos gravar vídeos que transmitam o que os nossos olhos reais veem no mundo real.
Escrito por Igor Romeu, gerente de marketing na SMI.